Sábado passado Shirley invectivou contra a tarde: A tarde
estava demorando muito a passar. Tudo bem, às vezes ocorre
isso mesmo, alguma coisa que ansiamos não chega e o tempo
se arrasta.
Não chovia, não fazia frio nem calor excessivos, não havia um
ruído irritante. Não, Shirley não se queixou de nada disso.
Apenas o tempo demorava a passar. O que há por trás disso?
A espera.
Não foi especificado o objeto da espera, mas a espera de
algum evento que mude nosso destino é sempre exasperante.
E quando tudo depende de alguém que tarda, a aflição toma
conta.
Pode ser um juiz, um advogado, uma testemunha, o diretor
da empresa, um professor... Não importa quem, há sempre
um reboliço em nossas emoções.
Mas quando se trata do ser amado... Ah!
Aí é quando qualquer formiga se transmuta em um dragão!
Contamos os nós num pingo d'água, vamos até onde o vento
faz a curva e voltamos num segundo, o mundo se acaba
várias vezes... E ele/ela não aparece!
Nesses momentos não é aconselhável passar perto da Shirley,
ela pode errar o alvo. Leia o poema:
TARDE
Shirley
(2015.08.08)
"Estaciono o carro
no meio-fio do silêncio
e o vento audacioso de agosto
desafia um gato que passa
se esgueirando pelo muro rebocado
pintado de cores sujas.
Nada é definitivo
nem essa espera
nem essas horas de asas trincadas.
Eu só preciso
de um nutriente essencial
para dar um ponta-pé
nessa tarde que custa a passar..."
*** *** ***
Ocupado em exames médicos, somente ontem pude atentar
ao poema, e minha focalização caiu exatamente nessa espera
do ser amado. Incorporei imediatamente o personagem que o
poema da Shirley sugere, e eis-me esperando Godot não, digo
melhor, Godeia.
Nessa situação, os macaquinhos brincam livremente no sótão,
e fantasmas e sombras diversas se aproveitam pra soprar suas
infaustas e nefastas sugestões. As perspectivas para o futuro
se enegrecem rapidamente e
"nada é divino, nada é maravilhoso".
Vejam a confusão instalada:
AIS
tesco
(2015.08.12)
Nada é definitivo
Nem mesmo essa longa espera
Se fosse amena, quem dera!
Porém tudo é aflitivo
Quando eu voltava ela ia
E não a encontro jamais
A sanha de saber tudo
Que duramente me assanha
Faz renascer velha manha
Que vai me deixando mudo
Em meio a formas sombrias
E proezas fantasmais
Ando todo estonteado
Não acho uma rota certa
Ao destino de poeta
Já me vejo condenado
Sem topar com alegrias
Mas recheado de ais
E em meio ao vento forte
Onde o sol jamais me brilha
A devassar uma trilha
Não encontro sul nem norte
Somente pausa queria
Nessas penas colossais."
*** *** ***
O consolo é justamente a realidade do primeiro verso:
Nada é definitivo!
Pois sabemos que "não há mal que sempre dure,
nem bem que nunca se acabe".
Abraço do tesco.
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2 comentários:
Estou aqui rindo, tesco... Eu não estava à espera de um importante evento, nem do ser amado. Fiz esse poema, dentro do carro estacionado, enquanto esperava uma pessoinha sair da aula de inglês rsrs...
Sua resposta está muito bonita.
Cuide da saúde!
Beijos!
Uma demora inquietante e um homem se colocando no meio disso tudo. Poderia ser a espera de um amor que nunca chega, e poderia ser um amor que nunca encontra seu repouso seguro... Quem sabe?
Boa semana pra vcs!
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