No post "Os degredados", de 4 de maio último, um dos
comentários foi de que:
"toda a Bíblia é um livro de Mitologia"..
Discordei, mas deixei a contestação para um post, pois
ficaria longo para um comentário.
A Biblia não é TOTALMENTE um livro de mitologia, nem
mesmo, SOMENTE um livro de mitologia. Sobre a parte
introdutória, sim, pode-se dizer que o livro do Genesis é,
na maior parte pelo menos, cópia de tradições dos mitos
da Mesopotâmia, e não poderia ser de outra forma, uma
vez que a própria Bíblia informa que o patriarca fundador
da etnia judaica, o "Pai Abraão", foi um caldeu, originário
de Ur.
Não existe a informação de que o livro de Genesis tenha
sido revelação a um patriarca ou a um profeta, portanto, é
lógico inferir que se trata de adaptações das tradições da
Mesopotâmia, transmitidos oralmente pois não se havia
adquirido o costumje de transmitir a tradição por escrito,
mesmo porque, pouquíssimos dominavam alguma arte de
escrever.
Ciro Flamarion Cardoso em "antiguidade oriental - Política
e religião" (em sorteio, aí embaixo), no capítulo 4 (Das
tribos de Yahveh ao Reino de Israel), nos diz que:
"Deus garante a fertilidade e a abundâbcia, mas não é
um deus da fertilidade, comanda os astros e cavalga
a tempestade, sem poder ser, em si, na sua natureza,
associado a qualquer destas coisas. Uma religião desse
tipo, necessariamente, coíbe o pensamento mítico."
Daqui se pode deduzir que a mitologia tem relação com
fenômenos da Natureza, se é unicamente isso, eu não sei,
mas essa relação, efetivamente, não é enfatizada na Bíblia.
Yahveh não é o deus dos raios, ou deus da colheita, ou
deus da guerra, ou deus da vingança, é o Senhor de tudo,
tem jurisdição sobre tudo, pois a tudo criou.
O professor Ciro prossegue em sua explanação:
"O texto bíblico abunda em mitos. Ao contrário do que
ocorria no Egito, na Mesopotâmia, ou entre os hititas,
porém, a natureza não é no pensamento bíblico, animada
e personificada, e portanto também não pode ser explicada
por relatos nos quais intervenham deuses que encarnam
forças cósmicas, num ongínquo passado mítico fundador
(o que abriria o caminho para que se pudesse obrigar o
universo a se comportar de certos modos desejados, já
que o mito informa um conjunto de gestos e palavras - o
ritual - bem como determinadas operações mágicas)."
O velho mestre, normalmente tão elucidativo, aqui me põe
no mato sem cachorro: Sua explicação da relação do mito
com o ritual não me esclareceu nada. De qualquer modo,
fica dito que, apesar da abundância de mitos na Bíblia, não
é essa sua ênfase, não é a explicação dos fenômenos da
Natureza que é buscada pela intervenção de Yahveh.
Isso fica bem explícito no parágrafo seguinte:
"O Deus de Israel não se associa aos acontecimentos
repetitivos e até certo ponto previsíveis da natureza, mas
à história, que ele comanda numa forma em geral
inescrutável."
Um episódio que serve como referência para essa última
assertiva, é a destruição deSodoma e Gomorra. O que
quer que tenha acontecido então, não é um fato rotineiro,
nada de repetitivo. Outras cidades serão destruídas, mas
não pelo mesmo método. Yahveh tem um bom repertório
de causas destrutivas.
Contudo, corroborando a afirmação de que "o texto bíblico
abunda em mitos", pode-se citar as alegorias do paraíso
terrestre, a expulsão do casal original do paraíso, a
tentativa de construção da torre de Babel, também o dilúvio
universal entra nessa lista.
Porém, os fatos históricos não são omitidos ou obliterados
na Bíblia, são sim, 'ligeiramente' alterados pela teologia
dominante naquela cultura. A interpretação de intervenções
divinas são uma constante na descrição dos fatos. E um
"pequeno" exagero, típico das culturas orientais, aparecem
para temperar as narrativas.
Como exemplo típico, cito o número de israelitas saídos do
Egito no êxodo. Tomo as palavras de Bruce Feiler em
"Pelos caminhos da Bíblia" (edição 2002, pp 241-242).
Esclareço que Feiler não é nenhum detrator da Bíblia, pelo
contrário, se declara judeu e fez esta pergrinação pela
Palestina, descrita no livro, para se identificar melhor com
o ambiente bíblico. Diz ele:
"ÈXODO
Mais do que descobrir por onde seguiram os israelitas, saber
quantos israelitas participaram do Êxodo, tem sido uma fonte
de curiosidade constante. O texto diz claramente que eram
600 mil homens a pé, além de mulheres e crianças."
Ele fala que dois censos foram realizados, um deles após
o primeiro ano e o outro 40 anos mais tarde, e ambos
encontraram mais de 600 mil homens. Diz, então, o seguinte:
"É claro que estes números não são citados por acaso.
Mas serão verdadeiros?"
E continua:
"...mais perturbador é especular como essa população
masculina de 600 mil homens, que, com mulheres e crianças
chegaria facilmente a dois milhõesde pessoas, pode ter
existido no Egito. Com base no cãlculo dos historiadores,
dois milhões de pessoas represenrariam pelo menos 20%
da população do Egito, o que tornaria iimaginável a tentativa
de escravizá-los e o fato de terem escapado sem que haja
qualquer referência a isto em nenhum documento odicial."
Como se vê, informação confusa não falta na Bíblia.
Feiler cita uma alternativa que torna a história plausível:
"Uma outra explicação mais comum é que o número 600
mil representa a população da monarquia unida de Israel
depois que esta chegou a Canaã, em meados do primeiro
milênio a.C,, na época aproximada em que a história bíblica
foi escrita. Isto tornaria os números coerentes com o fim do
Êxodo, não com o início. Seja como for, é lícito presumir
que 600 mil não é um número historicamente preciso."
Portanto, temos que ver a Bíblia com muito cuidado, nem
tomando suas afirmações como absolutas, nem fazendo
o contrário, desprezar suas informações como balelas ou
coisa de gente ignorante.
Além disso, a Bíblia para o mundo ocidental, enclui o dito
"Novo Testamento", que nos oferece os Evangelhos, que,
mesmo também eivados de mitologia, são a melhor fonte
de elevação moral para nós, os "degredados".
Então, não generalizemos os conceitos absolutos,
estudemos atentamente e será o melhor que podemos
fazer.
Abraço do tesco.
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5 comentários:
Tesco, meu querido
Observo uma coisa: a concepção pejorativa do mito. Não você, mas todos fazem isso. É em razão da ciência? pois eu não vajo nada de errado com os mitos. são explicativas de mundo que fogem á nossa razão, como se a nossa razão fosse garantia factual. E não é né?
Além da ciência, há a imaginação humana..
Mas tenho uma curiosidade: Você sabe como se contava o anos/tempo? porque a idade desse povo (da bíblia factual) é muito!
hiscla
Tesco, eu continuo achando que é mitologia, mas já pedi para o Antonio comprar não só a Bíblia, como também o Alcorão (a Bíblia já li anteriormente) para reforçar ou mudar a minha opinião.
Eu acho tudo ali um grande absurdo. Bom, não vou comentar mais, porque não se deve mexer com esse assunto sem causar mágoas.
Beijotescas
Acredito, hiscla, que, originalmente, os 'anos' bíblicos se referiam a ciclos lunares, tanto que, se dividimos as idades "estupidamente geladas" da Bíblia por 13 (são quase 13 ciclos por ano), obtemos idades compatíveis com o esperado.
Como exemplo, Matusalém, de idade bíblica 969 anos, teria vivido cerca de 75 anos reais (969/13), idade avançadíssima para os padrões da época.
Beijos.
Muito legal saber disso, eu nem imaginava como contavam esses anos. e vc, sempre me acudindo com seus saberes!
hiscla
Lendo o seu texto,tesco, aprendi mais, porém, confesso, não sou leitora da Bíblia. Aliás, todos sabem o que disse Leonardo da Vinci, que a Bíblia não chegou por fax, do céu e que passou por inúmeras traduções etc. Prefiro o Evangelho de Jesus.
Beijo!
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