Estava eu lendo o livro "Técnica de redação - O que é preciso
saber para bem escrever ", de Lucília Helena do Carmo Garcez
- é, aposentado tem dessas regalias, lê livro didático sem
nenhuma obrigação - e no capítulo 3 - "A qualidade da leitura",
logo no sub ítem 1 'o que é leitura', após alguma conversa
sobre leitura, naturalmente sobre as vantagens de ler, a autora
apresenta uma crônica de Luís Fernando Veríssimo.
É uma crônica intitulada "O Presidente tem razão", datada
de dezembro de 1998, em que Veríssimo ironizava a afirmação
do Presidente da República, na época, Fernando Cardoso,
que disse que "...a vida de rico, em geral, é muito chata”.
Transcrevo-a aqui, porque não é longa e porque
"vale a pena LER de novo":
"O PRESIDENTE TEM RAZÃO
Luís Fernando Veríssimo
Mais uma vez os adversários pinçam, maliciosamente, uma
frase do presidente para criticar. No caso, a sua observação
de que é chato ser rico.
Pois eu entendi a intenção do presidente. Ele estava falando
para pobres e preocupado em prepará-los para o fato de que
não vão ficar menos pobres e podem até ficar mais, no seu
governo, e que isso não é tão ruim assim. E eu concordo
com o presidente.
Ser pobre é muito mais divertido do que ser rico.
Pobre vive amontoado em favelas, quase em estado natural,
numa alegre promiscuidade que rico só pode invejar. Muitas
vezes o pobre constrói sua própria casa, com papelão e
caixotes.
Quando é que um rico terá a mesma oportunidade de mexer
assim com o barro da vida, exercer sua criatividade e morar
num lugar que pode chamar de realmente seu, da sua autoria,
pelo menos até ser despejado?
Que filho de rico verá um dia sua casa ser arrasada por um
trator? Um maravilhoso trator de verdade, não de brinquedo,
ali, no seu quintal! Todas as emoções que um filho de rico
só tem em video game o filho de pobre tem ao vivo, olhando
pela janela, só precisando cuidar para não levar bala.
Mais de um rico obrigado a esperar dez minutos para ser
atendido por um especialista, aqui ou no exterior,folheando
uma National Geographic de 1950, deve ter suspirado e
pensado que, se fosse pobre, aquilo não estaria acontecendo
com ele.
Ele estaria numa fila de hospital público desde a madrugada,
conversando animadamente com todos à sua volta, lutando
para manter seu lugar, xingando o funcionário que vem avisar
que as senhas acabaram e que é preciso voltar amanhã, e
ainda podendo assistir a uma visita teatral do Ministro da
Saúde ao hospital, o que é sempre divertido em vez de se
chateando daquela maneira.
E pior. Com toda as suas privações, rico ainda sabe que vai
viver muito mais do que pobre, ainda mais neste modelo, e
que seu tédio não terá fim. Efe Agá tem razão, é um inferno."
Correio Braziliense. Brasília, 2 dez. 1998.
Como se vê, qualquer adulto pode entender a ironia do
Veríssimo, não tem nada de esotérico.
Mas, a professora Lucília não pensa assim. Para ela, ler
Veríssimo é uma tarefa complexa, que exige diversas
aptidões e, por isso, faz essa explanação:
"Como a leitura faz inúmeras solicitações símuitâneas ao
cérebro, é necessário desenvolver consolidar e automatizar
habilidades muito sofisticadas para pertencer ao mundo dos
que lêem com naturalidade e rapidez Trata-se de um longo e
acidentado percurso para a compreensão efetiva e
responsiva que envolve:
• decodificação de signos;
• interpretação de itens lexicais e gramaticaos;
• agrupamento de palavras em blocos conceituais;
• identificação de palavras-chave;
• seleção e hierarquização de idéias;
• associação com informações anteriores;
• antecipação de informações;
• elaboração de hipóteses;
• construção de inferências;
• compreensão de pressupostos;
• controle de velocidade;
• focalização da atenção;
• avaliação do processo realizado;
• reorientação dos próprios procedimentos mentais."
Sacanagem! Com essa sistemática toda, para se ler uma
crônica do Veríssimo, duas opções se apresentam:
1. Estuda-se, com afinco, para adquirir estas 14 habilidades;
ou
2. Chuta-se esta lista para o mato e continua-se a ler
Veríssimo, como sempre se fez.
Já fiz minha opção.
Nota bene: A crônica é apresentada no livro, apenas como
um exemplo. A professora não dá a entender que tem
alguma prevenção contra Veríssimo.
Abraço do tesco.
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5 comentários:
Tbm fiz minha escolha.
Ler por ler e gostar... simples.
Por que tem gente que complica tanto as coisas? Para mim, ler é tão prazeiroso, que não consigo pensar em um só item da lista da autora. Muita paz!
Pois..deve ser pedagoga, não é?
hiscla
Dantinhas, ler Veríssimo geralmente é ótimo e nos faz rir, mas seus comentários também não são menos agradáveis, e olhe você não é canditado a Academia que efeh pertençe. Abraço , Chico
qual a palavra chave desse texto?
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