domingo, 1 de abril de 2018
"EU" CONTRA "EU"
Quando o Homem ainda jovem desejou cometer o primeiro
desatino, aproximou-se o Bom Senso e observou-lhe.
- Detém-te! Por que te confias assim ao mal?
O interpelado, porém respondeu orgulhoso:
- Eu quero.
Passando, mais tarde, à condição de perdulário e adotando
a extravagância e a loucura por normas de viver, apareceu
a Ponderação e aconselhou-o:
- Pára! Por que te consagras, desse modo, ao gasto
inconseqüente?
Ele, contudo, esclareceu jactancioso:
- Eu posso.
Mais tarde, mobilizando os outros a serviço da própria
insensatez, recebeu a visita da Humildade, que lhe rogou,
piedosa:
- Reflete! Por que te não compadeces dos mais fracos e dos
mais ignorantes?
O infeliz, todavia, redargüiu colérico.
- Eu mando.
Absorvendo imensos recursos, inutilmente, quando poderia
beneficiar a coletividade,abeirou-se dele o Amor e pediu:
- Modifica-te! Sê caridoso! Como podes reter o rio das
oportunidades sem socorrer o campo das necessidades
alheias?
E o mísero informou:
- Eu ordeno.
Praticando atos condenáveis, que o levaram ao pelourinho
da desaprovação pública, a Justiça acercou-se dele e
recomendou:
- Não prossigas! Não te dói ferir tanta gente?
O infortunado, entretanto, acentuou implacável:
- Eu exijo.
E assim viveu o Homem, acreditando-se o centro do
Universo, reclamando, oprimindo e dominando, sem ouvir
as sugestões das virtudes que iluminam a Terra, até que,
um dia, a Morte o procurou e lhe impôs a entrega do corpo
físico.
O desditoso entendeu a gravidade do acontecimento,
prosternou-se diante dela e considerou:
- Morte, por que me buscas?
- Eu quero - disse ela.
- Por que me constranges a aceitar-te? - gemeu triste.
- Eu posso - retrucou a visitante.
- Como podes atacar-me deste modo?
- Eu mando.
- Que poderes te movem?
- Eu ordeno.
- Defender-me-ei contra ti - clamou o Homem,
desesperado - duelarei e receberás a minha maldição!
Mas a Morte sorriu imperturbável, e afirmou:
- Eu exijo.
E, na luta do "eu", contra "eu", conduziu-o à casa
da Verdade para maiores lições.
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Irmão X ( Espírito Humberto de Campos)
("Contos e apólogos", psicografia Chico Xavier)
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