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domingo, 21 de julho de 2019

UMA CARTA DO INFERNO


Acabo de ler as "Cartas do Inferno", de autoria do escritor 
C. S. Lewis (Crônicas de Nárnia). que era também exímio 
teólogo cristão. Tem o dom de agradar tanto a católicos 
quanto a protestantes (evangélicos?). 

Os textos não são de um torturado sofredor no inferno, 
mas, instruções de um "alto burocrata" na hierarquia 
infernal, enviando instruções para um agente tentador 
de um jovem habitante do nosso planeta. 

O cenário é Londres no início da Segunda Guerra Mundial, 
mas as instruções são aplicáveis em qualquer  parte da 
Europa, nesse período. 

O que pretendo enfocar aqui, transcrevendo trechos da 
primeira carta, é a similitude dessa filosofia do capeta 
com o ideário político dos governantes (ou pretendentes 
ao governo) direitistas em toda parte, mas com o caso do 
Brasil, parece até instruções dirigidas diretamente a 
nossos (nossos?) políticos. 

Como se destina primariamente às questões espirituais, 
suprimi as partes eminentemente teológicas, pois abrange 
ideias que são integrantes do pensamento popular, mas 
que são aquelas difundidas pela Igreja Católica, o que, 
corresponde à tradição, mas não à verdade estrita. 

Confira nos trechos da primeira carta: 
-----------

CARTA Número 1 

Meu Caro Wormwood: 

[...] 
Parece-me que você está se convencendo que através 
da argumentação você pode afastá-lo da influência do 
Inimigo. 
Isso até seria aceitável, mas parta do princípio que sua 
vítima já se acostumou desde criança a ter uma dúzia 
de filosofias diferentes dançando em sua cabeça. 
Ele não usa o critério de "VERDADEIRO" ou "FALSO" 
para conferir cada doutrina que lhe apareça 
(seja do Inimigo ou nossa). 

Percebo que você tem intenções produtivas, mas há um 
problema muito grande quando tentamos persuadir o 
paciente a passar para nosso lado pelo emprego de 
argumentos e lógica: isto conduz toda a luta para o campo 
do Inimigo, que para azar nosso também sabe argumentar 
(e melhor do que nós). Por outro lado, no que diz respeito 
à propaganda prática (ainda que falsa) que lhe sugeri, nos 
situamos bem melhor. 

Pela pura argumentação, você despertará o raciocínio 
do paciente; uma vez que a razão dele desperte, 
quem poderia prever o resultado? 
Veja que perigo! 
Mesmo que uma cadeia de raciocínio lógico possa ser 
torcida de modo a nos favorecer, isso tende a acostumar 
o paciente ao hábito fatal de questionar as coisas, 
analisando as mesmas com visão geral, e desviando-se 
das experiências ditas "concretas", que na verdade são 
apenas experiências sensíveis e imediatas. 
Sua maior ocupação deve ser portanto a de prender a 
atenção da vítima de modo a jamais se libertar da corrente 
do "Se eu vejo, creio!". 
Ensine-o chamar esta corrente "Vida Real", e jamais 
deixe-o perguntar a si próprio o que significa "Real". 
Lembre-se do quanto os humanos são escravizados 
à rotina. 
[...] 
================
trecho suprimido 
================
Uma vez, tive um paciente, ateu convicto, que costumava 
fazer pesquisas no Museu Britânico. 
Um dia, estando ele a ler, notei que seu pensamento 
esvoaçava com tendência a um caminho errado. Com 
efeito, o Inimigo ali estava ao seu lado, naquele momento. 
Antes que desse por mim, vi o meu trabalho de vinte anos 
começando a desmoronar. Se tivesse entrado em pânico e 
tentado argumentar, eu estaria irremediavelmente perdido. 
Mas não fui tolo a esse ponto! 
Recordei da parte da vítima que mais estava sob meu 
controle e lembrei-lhe que estava na hora de almoçar. 
O Inimigo acho lhe fez uma contra-sugestão (você bem 
sabe como é difícil acompanhar aquilo que Ele lhes diz) 
de que a questão que lhe surgira na mente era mais 
importante do que o alimento. 
Penso ter sido essa a técnica do Inimigo porque quando 
lhe disse "Basta! Isto é algo muito importante para se 
meditar num final de manhã...", vi que o paciente ficou 
satisfeito. 
Assim, arrisquei dizer: "E muito melhor se você voltar 
ao assunto depois do almoço e estudar o problema com 
cabeça mais fresca. 
Não havia acabado a frase e ele já estava no meio do 
caminho para a rua. Na rua, a batalha estava ganha. 
Mostrei-lhe um jornaleiro gritando "Olha o Jornal da 
Tarde", e o Ônibus No.73 que ia passando, e antes que ele 
tivesse dado muitos passos, eu o tinha convencido de que 
sejam lá quais forem as idéias extraordinárias que possam 
vir à mente de alguém trancado com seus livros, basta uma 
dose de "Vida Real" (que ele entendia como o ônibus e o 
jornaleiro gritando) para persuadi-lo que "Aquilo Tudo" 
não podia ser verdade de jeito nenhum. 
A vítima escapara por um fio, e anos mais tarde, gostava 
de se referir àquela ocasião como "senso inarticulado de 
realidade, que é o último salva-vidas contra as aberrações 
da simples lógica". 
Hoje, ele está seguro, na Casa de Nosso Pai. 
Começa a perceber? 
[...] 
Os homens acham quase impossível crer em realidades 
que não lhes sejam familiares, se estão diante de seus 
olhos fatos mais ordinários. 
Insista pois em lhe mostrar o lado comum das coisas. 
Acima de tudo, não faça qualquer tentativa de usar a 
Ciência (digo, a verdadeira) como defesa contra o 
Cristianismo. 
Certamente, as Ciências o encorajariam a pensar 
em realidades que a visão e o tato não percebem. 
Tem havido tristes perdas para nós entre os cientistas 
da Física. 
Se a vítima teimar em mergulhar na Ciência, faça tudo 
que você puder para dirigi-la para estudos econômicos 
e sociais, acima de tudo, não deixe que ela abandone a 
indispensável "Vida Real". 
Mas o ideal é não deixar que leia coisa alguma de Ciência 
alguma, e sim lhe dar a idéia de que já sabe de tudo e que 
tudo que ele assimila das conversas nas "rodinhas" são 
resultados das "descobertas mais recentes". 
Não se esqueça que sua função é confundir a vítima. 
Pela maneira como alguns de vocês, diabos inexperientes 
falam, poderiam até pensar (que absurdo!) que nossa 
função fosse ensinar! 

Seu afetuoso tio,
Screwtape

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 Abraço do tesco e que Deus nos guarde! 


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