UTI

Estive lá, num tratamento de três dias (e
mais dois em apartamento). O motivo foi a
inchação na perna direita, com direito a uma
ulceração que já principiava a minar líquido.

Sempre visualizei a UTI através de filmes
na TV (na grande maioria filmes norte-
americanos) e a minha noção era de alguns
aquários, bem restritos ao pessoal médico
e recheados de alta tecnologia.

Onde estive não era nada disso. Muitos
eletrônicos, é verdade, com os alarmes mais
variados, mas trata-se de compartimentos -
cerca de vinte - separados por cortinas
suspensas no teto por rodinhas metálicas,
que em barulho superam a um pedreiro
apanhando brita com a pá, mais
parecido a um bazar de que outra coisa.

Muita gente, em alguns horários muitos
visitantes, um abre-fecha constante de
cortinas, som de torneiras esguichando
água, muita conversa entre os atendentes,
de vez em quando um técnico empurrando
uma unidade volante de reios-X, como um
pipoqueiro na praça, o que menos se ouve
é a voz dos pacientes.

A gente pode tirar um cochilo, certo, mas
quando pretende dormir mais, escuta uma
voz: tesco! (não me conhecem por tesco,
mas isto não vem ao caso), e me
apresentam um comprimido grande pra
reduzir a pressão, ou um pequeno com a
mesma função, ou é hora da picada para
medir a glicemia, ou a picada para injeção
da insulina, ou a injeção do antibiótico,
ou a medição da pressão...
Então recomeço a cochilar, aí é hora de
recomeçar o ciclo! Ufa!

Tudo isso foi causado por um 'pequeno'
relaxamento no tratamento da diabetes.
Pequenas transgressões não me causavam
mais que um pouco de inhação do
tornozelo por algumas horas. Era um alerta
grave, mas eu nem relacionava à diabetes.
Era uma pamonha (com açúcar!) aqui, uma
canjiquinha (com açúcar!) ali, uma dose de
Coca-Cola (com açúcar!) aqui, um mingau de
farinha- láctea (com açúcar!), ali... Daí passei
a me sentir livre, leve e solto para mais
aventuras.

Nos quatro dias anteriores à inchação da
perna me dediquei a saborear um delicioso
sorvete (com açúcar!) de três sabores de
fruta! Quando a perna inchou, assim
permaneceu naquele dia e no outro também.
Só na UTI é que relacionei uma coisa à outra.

A partir de agora não tem mais exceção:
Serei mais rígido no cumprimento do
"regulamento" do que um soldado nazista.
Tolerância zero! E não é por causa de
recomendações médicas ou conselhos de
amigos. Nem de preocupações filosóficas
com o sentido da vida ou elucubrações
teológicas com com a proximidade de morte.
Não! É que descobri com essa experiência
que tenho alergia à UTI's. Se tiver que vê-las
outra vez, vou prefirir as telas de TV.

Abraço do tesco.