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quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

O MARTELO DOS SACERDOTES

Este seria mais um ítem de "Bobagens linguísticas 20", a ser 
postado. Constatei, entretanto, que não havia questão
propriamente linguística, 
muito menos bobagem. Além disso,
estendi-me em diversas 
considerações, de modo que melhor
me pareceu postá-lo 
isoladamente. 

É outro verbete do "Dicionário etimológico - Termos médicos", 
de Simões, Lima e Baracat, onde encontramos explicação para 
um ossinho do ouvido ser chamado de: 

"MARTELO – 
do latim Malleus, martelo. 
O martelo, na idade média, tinha forma semelhante ao
utilizado 
na antiga Roma pelos açougueiros ou sacerdotes
para atordoar 
os animais antes da matança ou sacrifício. Este
instrumento era 
construído de madeira pesada e possuía
forma geral 
arredondada. O martelo moderno, com cabeça e
orelhas é 
invenção inglesa do século XVIII. Quem primeiro
parece haver 
descrito a bigorna e o martelo (ossículos da
audição) foi Vesálio 
(1550), que notou semelhança de forma
com os instrumentos do 
ferreiro e assim os denominou". 

Na verdade, nada tenho a comentar sobre o martelo, o que me 
chamou a atenção foi a sua utilização por "açougueiros ou 
sacerdotes". 

Veja-se a ironia: Os responsáveis pelo abate de animais e os 
responsáveis pela intermediação entre Deus e nós unidos numa 
mesma categoria, digamos assim. 

Isso acontecia porque, para os antigos, os deuses nos tinham 
criado "à sua imagem e semelhança", o que era perfeitamente 
lógico, se éramos "os reis da criação" deveríamos ser
parecidos 
com os deuses. 

Porém, os deuses eram antropomórficos, não somente na
forma 
física, mas no lado psicológico também. Portanto, tinham
todos 
os sentimentos dos mortais e sentiam semelhantes
emoções. 
Daí o porquê de ler-se no livro hebraico de Gênesis: 

"E edificou Noé um altar ao Senhor; e tomou de todo o
animal 
limpo e de toda a ave limpa, e ofereceu holocausto
sobre o 
altar. 
E o Senhor sentiu o suave cheiro, e..." (Gênesis 8:20-21). 

Este "Senhor" já era Jeová, mas ainda conservava a maioria
das 
características dos deuses do original babilônico (epopeia
de 
Gilgamesh). 

Os hebreus, contudo, davam mais valor às tradições do que às 
palavras dos profetas, pois estes afirmaram, falando por Jeová: 

"De que me serve a mim a multidão de vossos sacrifícios? 
diz o Senhor. Já estou farto dos holocaustos de carneiros, e 
da gordura de animais cevados; nem me agrado de sangue 
de bezerros, nem de cordeiros, nem de bodes." (Isaías 1:11). 



"Porque eu quero a misericórdia, e não o sacrifício; e o 
conhecimento de Deus, mais do que os holocaustos." 
(Oséias 6:6). 

Ouvidos moucos, pois, séculos depois destas advertências, já 
na época em que o Cristo pregava entre eles, ainda levavam 
bois, ovelhas e pombos, ao templo, em sacrifício a Jeová. 

Com a destruição de Jerusalém em 70 d.C., pelos romanos e a 
difusão do Cristianismo, a tradição alterou-se: Não mais oferta 
de animais, o próprio Cristo teria se oferecido em sacrifício. 
Ficam os sacerdotes liberados do uso dos martelos! 

Notem a dupla incongruência: Deus, que nunca havia pedido 
sacrifícios de animais, aceitava o sacrifício do Cristo, em 
substituição! 

Ademais, pensa-se que o sacrifício de Jesus foi sua morte, isso 
é estranho de se pensar, pois todos nós morremos, não há 
excepcionalidade nisso. "Mas foi uma morte na cruz!", dirão 
alguns, "Uma morte humilhante, ao lado de ladrões!". 

Ora, não é humilhante morrer entre ladrões, ou entre tarados, 
ou entre prostitutas, não há nada de humilhante em morrer, 
humilhação, neste caso,  é somente um conceito sócio-cultural. 
A verdadeira humilhação aqui é dos romanos, que submeteram 
um inocente à tortura. 

"Ah, então o sacrifício de Jesus foi ser torturado!". 
Também não, milhões de pessoas foram torturadas nesses dois 
mil anos, e nem por isso são consideradas Cristos de Deus.  
O legítimo sacrifício de Jesus foi submeter-se a uma existência 
física entre nós, brutos, que nos estapeamos por qualquer
"Ai! 
Meu pé! Tá cego, peste?". 

Mal comparando, é como se, em vez de estar deitado no sofá, 
numa sala com ar condicionado, tomando sorvete e ouvindo
um 
concerto de Vivaldi, estarmos no sertão do Nordeste, sob
o Sol, em meio a uma seca, 
cuidando de enfermos de AIDS. 

Desde o final do século 19 e por todo o século 20, os espíritas 
fomos acusados de depreciar o "sacrifício de Cristo, que
morreu 
na cruz por nós". Ora, ninguém valoriza tanto o
"sacrifício de 
Jesus" quanto os espíritas. Seguir suas
recomendações não é 
acender velas, cantar "O Senhor é
meu pastor", ou gritar que 
"O sangue de Cristo tem poder!",
nada disso. 


Valorizar o Cristo é amar o próximo como a si mesmo e auxiliá-
lo sem, por isto, visar recompensas, físicas ou espirituais. 
Esse é o espírito do Cristianismo. 

Abraço do tesco. 

5 comentários:

Anônimo disse...

Meu caro amigo, seus comentários me lembram "o martelo da feiticeiras", também idade média. Difícil mesmo compreender como acontece esses sacrifícios. E, já que falamos disso, queria lembrar a diferença básica entre umbanda e candomblé, pois muitas vezes toma-se um pelo o outro. O candomblé pratica ainda o sacrifício de animais das mais variadas formas (embora eu pense que o martelo já tenha sido abolido), já a umbanda manipula forças da natureza e dos ancestrais e não pratica sacrifico de forma alguma.
Interessante continuar sue raciocino também noutra perspectiva: o martelo dos juízes, pois esses determinam o destino de muitos dos seus julgados e batem o "martelo" . Não seria objeto de critica se vivêssemos numa sociedade voltada para a ética, porem, estamos longe disso!
hiscla

Clara Lúcia disse...

Perfeito seu post!
Se todos pensassem assim deixaria de uma hipocrisia que se vê tanto por aí. Amar o próximo próximo, amigo, querido, bom, é fácil, quero ver amar o defeituoso, o ruim, o culpado.

Beijos!

Denise Carreiro disse...

Análise perfeita! O sacrifício de Jesus foi reencarnar. Jesus está na esfera crística, isto é, evoluímos até espíritos puros, após atingirmos este patamar, iniciamos a evolução para chegarmos à esfera crística. Em seu grau evolutivo, Jesus está longe do corpo de carne e ter que se submeter a utilizá-lo, é um imenso sacrifício. Muita paz!

Shirley Brunelli disse...

Martelo...que sacerdotes maldosos, hein? Aqui em minha cidade, no dia de São Francisco de Assis, pessoas levam seus animais de estimação para serem abençoados pelos frades. Em seguida, pasme, esses servos de Deus, vendem ingresso para um almoço cujo prato principal é "porco no rolete"...Dá para aceitar isso? Uma vez liguei para um frade e disse o que eu queria, desci a bucha nele, pra não dizer outra coisa rs.
Mas, continuando, sabe que Jesus é um e o Cristo é outro? Jesus foi o médium de Cristo, que é um ser arcangélico, está acima de Jesus nessa hierarquia. É mais ou menos assim, o Mestre seria o Governador da Terra e o Cristo, da galáxia.
Outra coisa, achei o máximo, já existe há muito tempo, alguns candomblés vegetarianos.
Mas, tesco, vi você perambulando pelo Asfalto, todo afoito e logo pensei: Quantas taças de vinho ele tomou nessa tarde de sábado? rsrs
Beijão!!!

tesco disse...

Shirley, é extremamente lastimável que franciscanos
"abençoem" os "porcos no rolete".
Francisco, que não está em tumba nenhuma, olha-os com comiseração
e murmura Nosso Pai Celeste:
Perdoai-os, eles não sabem o que fazem".
Mas, essa teoria que individualiza Cristo e Jesus é um grande
equívoco:
A espiritualidade superior não pode agir desta forma.
A responsabilidade de todos os atos de uma pessoa são,
obrigatoriamente, dela mesma.
Que Jesus representava um poder superior a ele, ele mesmo
o disse, mas isso não o divide:
É ele mesmo o ungido, o escolhido, portanto, o Cristo de Deus.
E minhas efusões poéticas não se devem a vinho, deve ser influência de alguma erupção solar,
além, é claro, de seus versos, tão inspiradores.
Beijos.